domingo, 25 de dezembro de 2011

Futebol totalitário?

Convivo com um certo desconforto desde quando percebi que o futebol do Barcelona definitivamente não me encanta, ao contrário me provoca uma ansiedade e um certo enfado toda vez que o vejo jogar. Mesmo sem sucesso torço para o adversário na esperança de impedir a  série ininterrupta de vitórias  da máquina catalã. Amante do futebol e acompanhando as resenhas e transmissões sinto uma profunda solidão por me encontrar na contra mão da opinião geral. Até que li o texto do José Miguel Wisnik em sua coluna no Globo e afinal, compreendi quase tudo. Vamos a ele:
pintura Rubens Gerchman
Futebol totalitário?
A vitória acachapante do Barcelona sobre o Santos não é apenas um assunto da semana passada. Ela instaura uma questão de longa duração, que envolve o destino do futebol como um todo. Francisco Bosco falou sobre o equívoco daqueles que quiseram ver no brilhantismo vencedor do Barcelona um eco das propriedades primordiais do futebol brasileiro. Essa atitude corresponderia a uma conversão tardia do velho “complexo de vira-latas” num “complexo de dálmata”: o time catalão não seria senão uma imitação do Brasil nos seus melhores momentos. Eu pessoalmente não me deparei com essa síndrome, mas com um sintoma oposto. Pessoas muito próximas e muito queridas, não necessariamente santistas, sentem com estranheza, diante do “futebol total” do Barcelona, o desconforto que se sente diante das manifestações totalitárias. Um amigo me conta que, em Paris, um jovem bêbado, acho que francês, o interpelou acusando-o, como brasileiro, de render-se ao futebol “fascista” do Barcelona. A dupla acusação é toda despropositada, mas, nesse caso, a vaia de bêbado vale como índice de alguma coisa pedindo para se formular. Vejo futebol desde criancinha e acho, como Bosco e também como Tostão, que estamos  diante de um fenômeno inteiramente novo. O futebol-arte clássico “jogava e deixava jogar”, compensando as fragilidades com uma sobra generosa de invenção (como fez, a propósito, o Santos do primeiro semestre do ano passado). No outro extremo, o time botinudo “não joga e não deixa jogar”, compensando a fragilidade com a tentativa de tirar vantagem da lei universal da entropia. O Barcelona, jogando, não deixa o adversário jogar, a ponto de rasurar a fragilidade congênita das organizações humanas. Que monstro é esse, que ataca sem se expor? Uma das características que distinguem o futebol dos outros esportes modernos é a contingência da posse de bola. Em vez da alternância da posse ou do saque, como no basquete, no vôlei e no tênis, a bola é perdida incontáveis vezes para o adversário. Isso contribui para fazer do futebol uma narrativa mais parecida com a vida, cheia de alternativas épicas, dramáticas, líricas e trágicas. O Barcelona tem reduzido drasticamente essa característica estrutural do próprio jogo, o que chegou ao paroxismo numa partida de importância simbólica máxima como essa com o Santos. Uma distribuição coletiva implacável em campo, em permanente deslocamento, um domínio irritante do passe, uma neutralização instantânea do espaço adversário (a bola chegava muito dificilmente a Ganso e a Neymar, logo cercados, sem falar em Durval, Léo ou Henrique, incapazes de dar sequência a qualquer jogada que não fosse rifando a bola), em suma, um conjunto de ações conjuntas (o pleonasmo é proposital) fazia com que só o time catalão visse a cor da bola (as próprias bolas espirradas sobravam todas para eles). No limite, isso parecia não ter mais as propriedades erráticas do futebol, sendo, no entanto, uma extensão paradoxal, às últimas consequências, dos fundamentos do futebol. Com o que o Barcelona conseguiu a um só tempo anular as qualidades mais que evidentes do time do Santos e tornar flagrantes todos os defeitos menos visíveis. Para complicar, há Messi. Tudo o que eu falei até aqui descreveria a seleção da Espanha, igualmente eficaz na posse de bola, mas muito menos capaz de perfurar defesas. O argentino Messi contribui decisivamente para dar a tudo isso um poder de fogo vertical, e para dissolver o perigo retórico dopasse lateral numa perspectiva permanente de brechas achadas na defesa adversária, tantas vezes com tanta arte. Com isso, o time do Barcelona ganha simultaneamente um poder de ataque e uma solidez de conjunto que nem a seleção da Espanha, por um lado, nem a da Argentina, por outro, têm. Desfaz-se a oposição tradicional entre ataque e defesa, assim como a oposição entre o futebol jogado em prosa (baseado em passes e triangulações) e em poesia (baseado em surtos de criaçãoimprevisível). Combinam-se numa nova fórmula o futebol europeu e o sul-americano. De certo modo, o Barcelona dessa temporada realiza aquilo que o carrossel holandês prefigurou em surtos e em sustos na Copa de 1974. Mas como se, ao consumar a realização total da “ideia” (Tostão diz que o Barcelona, mais que um time, é uma ideia), ele decodificasse por um momento a impossível “quadratura do circo” de que se compõe o futebol (as bases desse argumento podem ser encontradas no meu livro “Veneno remédio — o futebol e o Brasil”). É por isso, justamente, que o futebol do Barcelona soa opressivamente totalizante, no sentido de que ecoa as formas do poder contemporâneo que dominam todos os meios em jogo, ao mesmo tempo em que ostenta um controle da situação que as periclitantes economias europeias perderam. A construção da seleção brasileira de futebol está mais atrasada do que a dos estádios da Copa. Curiosamente, a primeira partida sob o comando de Mano Menezes, contra os Estados Unidos, prefigurou um futebol capaz de dar uma resposta própria àquele jogado pela Espanha campeã do mundo. Mas isso dependia, entre outras coisas que não cabe analisar aqui, da confirmação daquele Paulo Henrique Ganso, que hoje não persiste depois de três contusões longas e de insondáveis dramas contratuais. O entusiasmo por Neymar é totalmente justo do ponto de vista futebolístico, mas opressivo como mitificação psicomidiática, que parece ter a função suspeita de esconder a fraqueza atual do futebol brasileiro. Se esta vier à tona no momento decisivo, mais que a capacidade de reinvenção do futebol brasileiro, a culpa, num mecanismo bem conhecido, será jogada sobre ele. 
Fonte: O Globo 

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Memória 1984

página do programa ( O Grande Circo Místico-Lisboa)


sábado, 17 de dezembro de 2011

No canto da música

É ingenuidade intelectual insistir em superficialidades, teses de descobrimentos inesperados, rompantes geniais surpreendentes interferindo no processo de produção, circulação e distribuição de riquezas que envolvem tanta gente, dinheiro e o modo de vida das nossas sociedades.
A indústria da música no mundo fez a opção pelo digital e se preparou para isso. A nova ordem estabelecida pelo avanço tecnológico, que é resultado de investimento, tratou de abandonar e finalizar o meio anacrônico superado. A pirataria, seu anti aliado, tem a função de impossibilitar qualquer recaída no modo de produção vencido, inaugurar a pedagogia do novo meio e impor a conscientização sobre as perdas institucionais que acarreta.
A indústria da música simplesmente não investiu nem mais um centavo no velho modo concentrando toda sua força e capacidade de resistência no estabelecimento da Nova Ordem que gradativamente vai se impondo com as legislações revistas e adaptadas para dar sustentação ao novo mercado digital, único meio de circulação e produção de riqueza para a música contemporânea. Os impecílios e ideologias contrários são vencidos sistematicamente.
Durante este período de reorganização não houve aproximação entre artista e público, ao contrário, o distanciamento se deve à falta de investimento e de locais de consumo, ausência de remuneração e mercado, enfim, o que se viu nesse período de transição foi o desestabelecimento da relação entre o artista e o público, a apropriação oportunista por pseudo artistas de um espaço em gestação e a pirataria desenfreada, a que desrespeita o direito e a propriedade do artista e portanto do conteúdo.
Paralelamente observamos um avanço colossal na presença da música anglo americana nos mercados de shows e apresentações ao vivo em todo mundo, derrubando as hegemonias locais e evoluindo em território de terra arrasada, desmobilizado pela pirataria e paralisado na ausência de mercado legal. A única música com investimento e geração de riqueza ocupou em toda parte o mercado de shows.
Registra-se ainda uma concentração do capital proprietário do conteúdo. Não se verifica crescimento do capital independente das grandes corporações, os independentes são absolutamente irrelevantes no mercado global comparado com as majors, que agora são três megacorporações, registrando-se portanto uma radical oligopolização do setor.
O que se chama de derrocada da indústria equivale a mal juízo, análise apressada, superficial e desinformada, a indústria da música de fato foi pioneira na implantação e adoção do meio virtual de circulação e se organiza gradativamente ampliando seu espectro global de exploração mercadológico. O superlucro dos anos 90 financia a viragem que assegura concentração de poder e riqueza por longo tempo. 

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

RECANTO

foto GL  Florença 
Estou estreando meu Itunes brasileiro, acabo de comprar Recanto da Gal Costa confesso com alguma alegria, afinal depois de tantos anos de loja virtual pelo mundo chega ao Brasil a tecnologia responsável pelo fim de uma das catedrais do meu tempo, as lojas de discos. O comércio da música no Brasil finalmente entra numa nova fase e se alinha ao mundo, já é tarde.

domingo, 4 de dezembro de 2011

Lembranças do Doutor


foto GL - Chelsea Londres


Conheci o Dr. Sócrates em Fortaleza quando fui fazer um show com Fagner. Passamos um dia inesquecível juntos. Começamos na Praia do Futuro, onde comemos caranguejos enquanto observávamos seu filho na praia chutando a bola. Ao invés de acertar o gol a brincadeira era acertar a trave. Sócrates sorria, e a cada tentativa certeira intuíamos um talento hereditário no menino, para seu orgulho. Conversamos sobre futebol e o Doutor lembrava que jogando na Itália sentia falta do sol para jogar. Com impressionante sensibilidade argumentava que o desempenho orgânico do atleta estava condicionado a geografia que o formara e no caso dele, o Sol e a temperatura quente eram matérias primas para seu jogo. Sem isso, nada feito, era preciso muito esforço, que aliás ele confessava ser uma atribuição em geral despercebida quando se fala de futebol jogado em competição, maltrata demais o jogador. O Doutor sabia que ao entrar em campo no mínimo tomaria uma surra a cada jogo e se resignaria com esses mal tratos semanais, quase diários. Praticava sua profissão apanhando literalmente. A vida de jogador, dizia ele, é duríssima sobretudo por conta da própria especificidade do esporte, violento e de contato intenso. Saímos da praia e fomos jogar futebol. A mesma elegância que deixara nos gramados o Doutor tinha espontaneamente, era fino e delicado, atencioso e sensível com todos. Em campo na pelada preferiu jogar na defesa, do alto dos seus olhos o campo ficava pequeno e ele esquadrinhava sempre a melhor jogada. Depois do jogo, a purrinha, o jogo dos palitinhos. O doutor era gregário, a alegria da convivência nele se manifestava evidente, esfuziante e intensa. Era um menino que a pretexto da proximidade com o outro, para estar em grupo e feliz, sabia competir como o jogo impunha. Quem conheceu Dr. Sócrates em campo sabe a extraordinária capacidade desenvolvida por ele, alto e magro, no exercício da prática, tanto que se tornou dos melhores do mundo. Recebi hoje, no dia de sua morte, um email de um antigo professor da Inglaterra, acusando o  sad day. Mas quem o conheceu  pessoalmente teve o prazer de desfrutar do convívio de um ser humano especial. Todo amor ao Doutor Sócrates para sempre. 
foto Gabriela London



Ledão!

foto GL
¿Qué le queda por escribir a un poeta de 87 años? Lêdo Ivo dijo que le gustaría decir algo que no ha dicho, «pero no sé qué es». «Soy un poeta incompleto».
disse o poeta brasileiro de 87 anos ao receber emocionado o Prêmio Leteo 2011 em Leon, Espanha.

sábado, 3 de dezembro de 2011

Complicações

foto GL
...E ter de subir a encosta                               
para a poder descer.                                                 
E ter de vencer o vento.                                    
E ter de lutar.Um obstáculo                             
para cada novo passo...                                       
E o fim sempre longe,mais longe.                       
Ah mas antes isso!...                                       
Ainda bem que tudo é                          
infinitamente difícil.                                 
Ainda bem que temos                                                 
de escalar montanhas...                                                 
Ainda bem que o vento                                        
nos oferece resistência                                       
e o fim é infinito. Ainda bem.                   
Antes isso. 50 000 vezes isso 
à igualdade fútil da planície.    
                                                                                                                                                                                     
Mário Dionísio "Complicações"

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

A questão é perceber de fato quem são os pró-ativos?


pintura Gonçalo Ivo
iTunes Preparando Lançamento na América Latina
Na sequência da sua bem-sucedida incursão no México, o iTunes está preparando o lançamento em outros países latino-americanos no final do ano ou até o primeiro trimestre, o mais tardar, dizem fontes familiarizadas com as conversas. Um porta-voz do iTunes não quis comentar, mas uma grande variedade de executivos de diferentes áreas da indústria musical dizem que o varejista vai certamente abrir lojas na Argentina e no Brasil e provavelmente em vários outros países na região. Algumas fontes dizem que a loja brasileira será aberta logo em meados de dezembro. 
ITunes vem negociando separadamente com as editoras e gravadoras e, sem dúvida seu sucesso no México, sua primeira atuação no mercado latino-americano, ajudou a impulsionar a decisão de expandir para outros países latinos, começando, dizem as fontes, precisamente com o Brasil. No México, antes do advento do iTunes em 2009, o mercado de música online era praticamente inexistente, mesmo se houvesse lojas de música online. Mas em 2010 havia quase 13 milhões de faixas vendidas online, de acordo com a associação das gravadoras do México (Amprofon) - um aumento de 116,3% sobre 2009, com a maioria dos resultados provenientes do iTunes. Para os primeiros seis meses de 2011, as vendas digitais em grande parte realizadas pelo iTunes cresceram 7,7%, de acordo com Amprofon, em comparação a 2010, mesmo com a queda das vendas físicas de 11%. "Isso é o indicativo positivo de que quando as pessoas têm mais opções para aceder a música legalmente on-line (através de downloads, streaming e serviços de assinatura) mais eles fazem isso, o compartilhamento ilegal de arquivos irá diminuir e, se bem gerido, o verdadeiro valor da música vai crescer ", diz Robbie Lear, diretor da EMI México. Apesar de muitos outros países latinos viram suas vendas digitais aumentando ao longo dos últimos anos, as vendas vêm principalmente de dispositivos móveis, como  ainda não há lojas de música on-line verdadeiramente bem sucedidas na região. A única exceção é o Brasil, onde as vendas de música digital para os primeiros seis meses do ano, de acordo com números da IFPI, situou-se em um valor por atacado de 22,1 milhões dólares e teve um crescimento de 2% em relação ao ano anterior. Talvez o mais importante, na medida do iTunes está em causa, o Brasil tem mostrado a sua vontade de comprar música online, com a maioria de suas vendas de música digital provenientes de fontes on-line; segundo algumas estimativas, o serviço de subscrição Sonora sozinho tem cerca de 500.000 assinantes pagantes. "É um mercado digital que está crescendo e tem uma receita interessante", diz Alejandro Duque, diretor de vendas e desenvolvimento de negócios da Universal Cone Sul . No entanto, os fãs de música "definitivamente não consomem com a freqüência que eles poderiam se tivessem acesso direto à música em seus dispositivos." Mesmo que ninguém saiba ao certo quando e onde o iTunes vai abrir, as possibilidades vão além de vendas imediatas, "Qualquer meio de distribuição que for confiável e amigável são sempre importantes para nós das gravadoras independentes ", diz Tomas Cookman, presidente da indie norte-americana Nacional"Mesmo sendo um importante mercado de shows e financeiramente compensador, a América Latina é um sucesso ainda em falta. Há muitos produtos para trabalhar a qualquer momento e as majors, obviamente, têm seu largo repertório da própria região nas mãosCom o lançamento do iTunes Latino e o crescimento da sua penetração, estaremos mais e mais incluindo o restante da América Latina de volta em nossos contratos. "