quarta-feira, 15 de agosto de 2012

A intenção frouxa

damien 

Na intenção de justificar a derrota brasileira do futebol nas Olimpíadas o intelectual Francisco Bosco em seu artigo no Globo dispara teses e juízos para nos fazer acreditar que a nossa hegemonia se acabou. Para tanto ele funda um novo futebol onde o talento individual é incapaz de decidir uma partida. Vê-se logo, quem conhece o ambiente das quatro linhas, que nosso sábio não jogou bola. O que o futebol revela é o craque, o futebol existe pra isso e exatamente por isso. Quando Parreira disse a filosófica sentença: “o gol é um detalhe”, errou acertando. O futebol é para o craque. Em campo, todo jogador sabe quem é o craque, que se revela num instante. “Ele”, era como o genial locutor da Tv Excelsior se referia quando a bola estava com Pelé. Hoje quase ouvimos a mesma coisa quando ela está com Messi. Foi assim com Zico, Maradona, Garrincha a alegria do povo, e tantos…o futebol é do craque e sua revelação é o mistério do jogo, e o gol, o detalhe.
Ou seja, Bosco está enganado na partida. É natural que ele demonstre admiração pelo atual técnico da seleção, o Mano. Diz que ele rompe com provincianismo e seus parâmetros avançados passam longe do nosso futebol. Ora, Mano seria um bom analista de TV, comentarista de partidas, tem boa retórica e agrada os ouvidos mais sofisticados no uso do vernáculo. É aí onde moram sua perícia e novidade. Mas o ex-zagueiro Edinho, agora comentarista, descreveu muito bem a diferença no intervalo de uma recente partida difícil para o selecionado brasileiro: “O Mano fala bem dos problemas mas ele se esquece que é o técnico, que ele tem é que mexer no time e não analisar jogos”. Ou seja, Edinho é um craque, percebeu porque sabe da diferença. Não basta a dialética ali no campo, tem uma especificidade que é própria.
O intelectual quer nos ensinar a perder, quer que admitamos uma superioridade no adversário, quer invocar mais uma vez nossas síndromes de inferioridade, quer solapar nossa arrogância, nossa pretensão hegemônica, ali…no campo. Quer que nos habituemos com a possibilidade de…perder. Ou seja, não jogou bola. Nunca disputou um racha numa calçada de rua, nunca arrebentou um dedo nem teve uma bolha no pé, daquelas que tomam quase toda sola. Não sabe o que é isso, não sabe das motivações de uma partida de futebol, do balé e da potência, do drible, da capacidade de enganar o adversário para desconcertá-lo, desequilibrá-lo, ultrapassá-lo enfim. É preciso muita arrogância para partir pra cima com a bola dominada, muita pretensão para finalizar uma jogada com um tiro na meta do adversário, é preciso ter peito e raça para decidir uma jogada. Quem entra admitindo a derrota nunca consegue a vitória, a derrota é uma contingência nunca admitida a priori. Os jogadores choram na derrota. Será que nosso sábio já chorou com a camisa suada, os pés em frangalhos, os músculos moídos e um placar adverso em campo?
E a análise da partida é bisonha, ingênua, trouxa. Relegar o drible ao fundamento tático só na Dinamarca.  Devemos começar por admitir que somos os melhores e que somos obrigados a sê-lo sempre. Justamente o oposto do que sugere nosso intelectual.
Para entrar nos aspectos que agora nem interessam, apenas para não deixar o pitaco sem resposta, o que observamos na terrível partida foi que o meio campo brasileiro não existiu. Sandro, Rômulo e Oscar não empreendiam um jogo que provocasse mais dinamismo no ataque. Mal escalado, Sandro nunca mostrou qualidades para ser selecionado, e com Oscar frágil e sem inspiração, era nítida a exigência da presença de Lucas, mas o que fez o Mano? Entendeu que o ataque não funcionava e colocou Pato, o time ficou definitivamente sem meio campo. Impossível desrespeitar a tradição sem ser penalizado, e quem pagou o pato fomos nós.
A derrota para o México é injustificável e como disse Romário é culpa do Mano. E Romário é que sabe.


Amigos, o mínimo que se pode esperar do subdesenvolvido é o protesto. Ele tem de espernear, tem de subir pelas paredes, tem de se pendurar no lustre. Sua dignidade depende de sua indignação. Ou ele, na sua ira, dá arrancos de cachorro atropelado, ou temos de chorar pela sua alma.
[...] Eu vi que a tragédia do subdesenvolvimento não é só a miséria ou a fome, ou as criancinhas apodrecendo. Não. Talvez seja um certo comportamento espiritual. O sujeito é roubado, ofendido, humilhado e não reconhece o direito de ser vítima.

[...] Oh, meu Deus do céu! Virgem Santíssima! Nós já somos um povo que não faz outra coisa senão perder! Olhem a nossa cara. Reparem: – é a cara da derrota. Afinal de contas, o que é o subdesenvolvimento se não a derrota cotidiana, a humilhação de cada dia e de cada hora? E é uma ignomínia que venha alguém dizer a esse povo desesperado: – Vá perdendo! Continue perdendo! Aprenda a perder!”.” (Nelson Rodrigues). 

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